"...é concebível que acabemos descobrindo mais e não menos mulheres autistas, assim que examinarmos melhor; talvez a célebre vantagem feminina na linguagem e inteligência social proteja algumas mulheres, nascidas com a herança genética do autismo, excluindo-as da categoria diagnosticável de "autismo de alto funcionamento" e incluindo-as na forma disfarçada e não manifesta do distúrbio.(...)" (John J. Ratey e Catherine Johnson, no livro "Síndromes Silenciosas", p.235 Ed. Objetiva)
"A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem moradas deslumbrantes que eles guardam para os poucos capazes de os sentir e entender. Nessas moradas estão tesouros da ternura humana dos quais só os diferentes são capazes. Não mexa com o amor de um diferente. A menos que você seja suficientemente forte para suportá-lo depois". (Arthur da Távola)

Seguidores

sexta-feira, 5 de março de 2010

Aceitar-se 2

Olá!
Bem, vou continuar no assunto da aceitação, é bem difícil para mim ter que sempre justificar o que falo e o que faço, sempre me sentindo inadequada e inoportuna, é claro que isto também tem relação com a falta de auto estima, a tão famosa AUTO ESTIMA...
O que me restou foram alguns pedaços de coragem e medo!
Auto estima é um dos novos projetos, mas não vou seguir as "auto-ajudas" da vida, pois meu mundo é outro!
Acho muito apropriado o termo usado mos E.U.A. para designar o Autismo:
Síndrome do "Ops que planeta é este?", já me peguei muitas vezes me perguntando de que planeta eu vim!
Esta semana eu andei divulgando meu blog, em algumas comunidades do Orkut das quais eu participo, e foi muito bom, recebi alguns comentários bem interessantes, como o de um leitor que me perguntou se eu era Asperger ou Autista? Acho que ele me achou muito articulada para ser autista, mas na verdade eu não tenho algumas características para que eu seja Asperger, então sou autista.

E por falar em Asperger, não posso deixar de contar para vocês mais uma das minhas peripécias:
Estou eu divulgando este meu blog numa comunidade Asperger, só que na síndrome de Asperger os portadores são 90% homens, mas tudo bem eu já havia postado a divulgação achei que algum deles poderia se interessar. E bem abaixo da minha divulgação estava uma postagem de um pesquisador da mente Asperger, o texto do pesquisador era um questionamento sobre como os Aspergers viam a questão da "Fé" que é um assunto abstrato , pois os Aspergers tem o chamado "pensamento concreto",que também é característica de qualquer outro portador da síndrome do espectro autista, e abaixo vinham as respostas, todas de rapazes e praticamente iguais.

Na realidade me senti mais uma vez sendo inadequada por ser uma comunidade praticamente só freqüentada por homens, mas o que me surpreendeu foi o que outras pessoas comentaram, como a pergunta daquele homem que eu citei acima: se eu era autista ou Asperger, e uma outra pessoa respondeu que o neuropediatra do filho dela disse que em breve o Código Internacional De Doenças(CID), não fará mais distinção de Asperger e Autistas de alto funcionamento, ou seja todos seremos portadores de "autismo leve".

Eu sempre lembrarei que estas denominações todas são para as PESSOAS e não para o AUTISMO!

Vou contar agora mais uma das minhas tentativas, espero que seja uma das últimas, de provar para os outro e talvez para mim mesma que realmente sou autista:

Reencontrei uma amiga de infância através da internet, fazia uns vinte anos que não nos comunicávamos, e aí vieram as conversas e eu mais uma vez me comportei de forma infantilizada na forma de cobrar dela algumas atitudes que no passado me magoaram muito, resultado ela não entendeu nada pois nem lembrava de muita coisa, e ficou indignada com algumas cobranças, então resolvi contar para ela que eu era portadora do espectro autista e falei deste blog.
Ela com todo o direito que tem, ficou com muitas dúvidas.

Vou dividir com vocês a minha "tentativa", o texto começa com a resposta da pergunta que ela me fez sobre o título do blog ser coincidência ou eu ser realmente autista.
Eis a minha resposta:

"...Não foi apenas uma coincidência, não! Eu sou autista, porém na época em que eu era criança as pessoas não sabiam que existia o "autismo de alto funcionamento" muito menos que poderíamos ser "verbais", portanto esta culpa minha mãe não carrega, mas como minha mãe é uma pessoa com um temperamento extremamente "ativo" e muitas vezes "invasivo", e para piorar ela também tem pouca aceitação para transtornos mentais, as vezes acha que é "falta de vontade" ou "mimo" então ela não me respeitou nesta questão e sempre tentou me "educar", até descobrirmos, atualmente, que eu sou autista, ela me cobrava quando eu iria crescer, quando iria parar com meus "chiliques", e esta cobrança não é só dela, mas ainda é da família inteira.

Dizem que meu discurso é muito correto e adulto, mas não condiz com as minhas ações, isto realmente acontece,e é realmente o meu maior sofrimento!

Esta imaturidade existe na forma de nos comunicarmos e nos relacionarmos, ou seja na tríade de comprometimento da mente autista:
1- Socialização, 2- Comunicação, 3- Imaginação , mas mesmo quando não nos comunicamos temos sentimentos em relação ao que nos acontece, e o constrangimento pela falta de adequação é um fato e a tristeza de muitas vezes perder oportunidades... enfim apesar de parecermos muito capazes pois existe o discurso bem articulado, porém este discurso quase sempre é racional por não conseguirmos sentir o que falamos, nem sempre agimos de acordo com nosso discurso e isso também tem relação com a falta de empatia.

"...O Autismo não é uma condição de "tudo ou nada"; ao contrário, é visto como um continuum que vai do grau leve ao severo. Existe uma grande associação entre autismo e retardo mental, desde o leve até o severo, sendo que considera-se que a gravidade do retardo mental não está necessariamente associada à gravidade do autismo.
A palavra autismo atualmente pode ser associada a diversas síndromes. Os sintomas variam amplamente, o que explica por que atualmente refere-se ao autismo como um espectro de transtornos
Dentro deste espectro encontramos sempre a tríade de comprometimentos que confere uma característica comum a todos eles. Alguns são diagnosticados simplesmente como autismo, traços autísticos, etc, ou Síndrome de Asperger (considerado por muitos como o autismo com inteligência normal). Além destes, existem diversas síndromes identificáveis geneticamente ou que apresentam quadros diagnósticos característicos, que também estão englobadas no Espectro do Autismo."

(Fonte:"Site da AMA")

Eu e meu marido casamos por nos identificarmos muito com estas características todas, mas só fomos saber que somos portadores do espectro autista depois do diagnóstico da nossa filha.

Realmente o Autismo é um assunto bem complexo, e interessante ao mesmo tempo, não é a toa que fizeram dezenas de filmes com o assunto.
Começou a ser diagnosticado como doença faz muito pouco tempo, era considerado "birra" de criança mal educada, ou rejeição dos pais.

As pessoas ainda tem aquela visão da criança sentada se balançando ou girando tampas de lata, mas isso acontece quando a criança tem o chamado autismo clássico, e estas crianças simplesmente se balançam e repetem o mesmo movimento para tentar se acalmar e ter alguma sensação de conforto dentro desta desconexão e confusão mental que é quase sempre insuportável, podem acontecer crises de agressividade, afinal poucos profissionais diagnosticam com facilidade pois é uma doença altamente complexa, e esta demora ,ou mesmo, a falta do diagnóstico agravam muito a situação do autista.

Eu sou autista de alto funcionamento e verbal, meu marido é Asperger (aquele que é considerado com inteligência normal, porem a mente é altamente sistematizada), meu filho tbém é Asperger, mas vc deve ter lido no blog no texto do Dr. Christopher Gillberg que não devemos dar estas denominações para o autismo e sim para o pessoa, ou seja, EU sou verbal e de alto funcionamento, o autismo é o transtorno do qual eu sou portadora, esta doença é complexa porque em cada indivíduo se manifesta de um jeito, o autismo tem sua origem na falta de algumas conexões cerebrais que resultam numa confusão mental gigantesca, e numa necessidade absurda de controlar o meio em que vivemos para tentar minimizar esta confusão que muitas vezes nos transtorna e deprime.
Retirei este trecho da página da comunidade do orkut: "Não à banalização do autismo":

Autismo:
1.estado mental caracterizado por uma concentração patológica do indivíduo sobre si mesmo;
2.ensimesmamento;
3.alheamento do real;
4.predominância da vida interior;
5.subjetivismo delirante.
fonte: http://www.infopedia.pt/default.jsp

A minha vontade é dividir minhas descobertas com vc, e talvez esclarecer mais um pouco as suas dúvidas."

E esta foi mais uma tentativa de me explicar, e tentar me aceitar!

Me despeço agora e fico a disposição para qualquer dúvida ou comentário, no meu email: tidymae@hotmail.com

Abraços e fiquem com Deus!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Autismo de alto funcionamento:

"Eu gostaria de acentuar que chamar este transtorno de autismo de alto funcionamento, é inadequado porque o termo sugere que o autismo é de alto funcionamento, que o autismo é leve, quando na verdade o que você está querendo é denominar uma pessoa de alto funcionamento com autismo.

Então, essa pessoa pode ter um bom QI ou uma boa compreensão verbal ou uma boa expressão verbal, mas seu autismo é normalmente tão grave quanto o de uma pessoa descrita com autismo de baixo funcionamento.

Então, por favor: usem alto funcionamento para a pessoa, não para o autismo, de maneira a permitir uma compreensão mais profunda de quão grave o autismo pode ser, mesmo para alguém com Síndrome de Asperger..."

(Dr. Christopher Gillberg, em out/2005 no auditório do InCor em SP)

Dr. Simon Baron-Cohen, diz no seu livro "Diferença essencial: a verdade sobre o cérebro de homens e mulheres.":

"...Dirijo uma clínica em Cambridge para adultos com suspeita de serem portadores da síndome de Asperger. Esses indivíduos não tiveram os problemas detectados na família nem na escola enquanto ainda eram crianças.

Assim, atravessaram a infância e a adolescência aos trancos e barrancos, e chegaram à idade adulta acumulando dificuldades, até serem encaminhados à nossa clínica, desesperados pela falta de integração, por se sentirem diferentes.

Na maioria dos casos, esses paciente sofrem também de depressão clínica, já que não encontram um ambiente, em termos de trabalho e de companheiro(a), que os aceite em sua diferença. Querem ser eles mesmos, mas são forçados a "vestir" um personagem, tentando desesperadamente não ofender, dizendo ou fazendo a coisa errada, e ainda assim, sem saber quando vão receber uma reação negativa ou ser considerados" seres estranhos".

Muitos deles se esforçam em administrar um enorme conjunto de regras relativas ao comportamento em cada situação, e consultam de minuto a minuto uma espécie de tabela mental, buscando o que dizer e o que fazer. É como se tentassem escrever um manual de interação social baseado em regras de causa e efeito, ou como se quisessem sistematizar o comportamento social, quando a abordagem natural à socialização deve ser através da empatia.

Imaginem um livro bem grosso de etiqueta sobre como agir em jantares,...mas escrito em detalhes, para cobrir todas as eventualidades do discurso social.

Claro que é impossível aprender tudo, e embora alguns desses indivíduos brilhantemente quase consigam, acabam fisicamente exaustos. Quando chegam em casa depois do trabalho, onde fingiram interagir normalmente com os colegas, a última coisa que querem é socializar. Só pensam em fechar a porta do mundo e dizer as palavras ou praticar as ações que tiveram de reprimir o dia todo.

Gostariam que os outros dissessem o que pensam e que eles pudessem fazer o mesmo; não entendem porque não podem.

É difícil para eles compreender como uma palavra sincera pode ofender ou causar problemas sociais."...

POEMA EM LINHA RETA

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)


Publicações do blog (arquivo):